Como aproveitar seus investidores da melhor forma para a sua startup?

Canary
8 min readFeb 12, 2019

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Oplaybook” de startups (se é que dá pra dizer que existe um) é iniciar a operação com capital dos sócios ou de amigos/familiares e ver se a ideia de fato faz sentido. À medida que a ideia se torna um projeto e vira uma empresa, os fundadores precisam de um volume mais expressivo de capital para fazer o negócio funcionar. Levantar capital em troca de participação da empresa é uma prática comum de startups de tecnologia, que, quando escolhem esse caminho, dividem o cap table (estrutura acionária) com investidores anjos e fundos de venture capital. Para aproveitar melhor todas essas partes e não gerar complexidade desnecessária de governança, listamos aqui alguns aprendizados de quem já passou por isso.

Casamento de longo prazo

A assinatura de um contrato de investimento é a oficialização de um relacionamento de longo prazo. Para evitar se comprometer com algo ou alguém que possa se tornar prejudicial para você ou sua empresa, você deve escolher o investidor que mais se encaixe tanto com o seu perfil, como com a sua visão.

Benjamin Gleason, fundador do GuiaBolso conta que, no início, ter investidores com perfil de operador (que já tinham experiência construindo ou escalando startups) foi essencial. Nesse estágio, a dica é fugir de investidores com visão prioritariamente financeira (perfil mais “private equity”), que tendem a se preocupar mais com o balanço/DRE da empresa. É que esse tipo de guideline pode atrapalhar bastante quando você está buscando market fit ou começando a ganhar escala. Esse perfil de investidor é melhor aproveitado quando a empresa está mais madura e levanta rodadas maiores (Series C para frente).

É importante ter uma visão, desde o início, de quem você quer no seu cap table. A estratégia de cada rodada de fundraising e da diluição depende de quantos (e quais) fundos você quer como seus investidores. Investidor tem que agregar e não pode atrapalhar — a escolha de quem será seu sócio é sua, não deve ser de ninguém mais.

Algumas dicas para garantir um bom filtro de investidores:

Checagem de referência: conversar com investidas (tanto as bem sucedidas quanto as que estagnaram ou morreram) sobre como esse investidor se comporta no dia a dia e qual o seu valor agregado. Algumas respostas que você deveria buscar sobre o perfil do investidor:

  • É mais ativo ou passivo? Faz acompanhamentos periódicos? Exige reports ou reuniões presenciais? Pede muitos detalhes ou deixa na mão do founder?
  • Qual o grau de comprometimento do fundo com o crescimento da empresa? Ele usa apenas o chapéu de investidor ou também se coloca no lugar do empreendedor?
  • Tem expertise no seu mercado de atuação? Tem expertise nos desafios que sua empresa vai enfrentar (aquisição de clientes, produtos digitais, etc)?
  • Quão ativo é o fundo em termos de conexões? Qual é o valor da sua rede de contatos?

Due diligence: checar com investidores desse fundo (LPs), pesquisar o track record (histórico), tamanho e maturidade do fundo, forma de operar, termos, reputação no mercado etc.

Para investidores estrangeiros: verificar o quão acostumados eles estão com mercados emergentes. Isso ajuda a escolher o melhor sócio no longo prazo — afinal, você quer encontrar aquele que não vai te ligar todo mês pedindo explicações sobre a volatilidade do Real, o cenário político ou o Zika vírus.

Definindo os termos desde o início

O ideal é que seu contrato atual possa ancorar a rodada subsequente, sem mudanças muito significativas. Definir termos justos, simples e limpos para ambos os lados está na base desse relacionamento e permite filtrar novos investidores que estejam alinhados. No final das contas, o objetivo é eliminar fricções para uma próxima rodada. Cuidado com algumas cláusulas que protegem investidores, mas que podem ser prejudiciais para o founder, como:

  • Investidores com saída já pré-definida: indica falta de alinhamento de longo prazo do investidor e passa uma mensagem ruim para investidores novos.
  • Aumento de participação para um investidor específico: pode criar fricção para outros investidores (atuais e futuros).
  • Preferência de liquidação desalinhada com o mercado: é uma proteção do investidor principalmente contra aquisições “acquihire” (onde os empreendedores e time são contratados por outra empresa, mas entregam a startup por um valor muito baixo, fazendo com que os investidores não participem da transação). Vale ficar atento para que essa cláusula não seja uma fricção para futuros investidores e compradores.
  • Poder de veto: pode enrijecer a governança e tornar complexa as tomadas de decisão dentro da startup, além de criar fricção para outros investidores (atuais e futuros).
  • Diluição excessiva: investidores que buscam uma participação muito fora da curva, inibem o crescimento da startup (aprofundamos o tópico neste post ).
  • Assento em conselho: não deveria ser algo distribuído facilmente, “you have to earn it”.

Anjos devem agregar valor

No começo do negócio, ter investidores individuais (anjos) com expertises complementares às dos founders é uma iniciativa comum e boa fonte de valor agregado para o empreendedor. Importante ficar atento, porém, para que a gestão dos anjos não se torne sua atividade principal.

O ideal é que os founders busquem pessoas que: (1) estejam acostumadas a investir e/ou conheçam a dinâmica de startups; (2) tenham skills relevantes para o negócio (contatos, conhecimentos de indústria, produto ou modelo, etc). O GuiaBolso, por exemplo, buscou founders de fintechs bem sucedidas nos EUA e VPs de growth e produto de startups americanas bastante maduras para o seu captable. Empreendedores ou operadores (c-level / VPs) de startups que já exploraram o mundo que você quer entrar também têm expertises muito valiosas e maior probabilidade de ajudar, sem criar fricções.

Cap table trabalhando a seu favor

Ter muita gente querendo investir na sua empresa normalmente é um bom sinal. Com mais diversidade de investidores, o founder tem acesso a diferentes redes de contato e conta com mais possibilidades de ajuda, além de fragmentar o controle da empresa. Por outro lado, também implica em uma gestão de investidores mais complexa: lembre-se de que, para extrair o máximo de valor da expertise ou rede de contatos do seu investidor, você precisa manter um relacionamento próximo (o tempo e energia alocados varia com o número de investidores no seu captable).

Existem várias ferramentas para engajar investidores a alocarem tempo na sua empresa. Desde iniciativas recorrentes, como pedidos de ajuda em reports e reuniões de conselho, até apresentar um sócio que tenha profunda expertise em uma área ao seu time. A tendência é de que interações individuais com investidores sejam muito mais proveitosas do que coletivas (como em reuniões de conselho, por exemplo). Vale investir tempo em calls ou cafés individuais.

Transparência é o melhor alinhamento

Startups passam por altos e baixos. É papel do fundador não só informar seus investidores sobre o que está acontecendo, mas também mantê-los engajados e animados com o negócio no longo prazo. Isso só é viável sendo transparente desde o início. Uma dica prática do Luciano Tavares, fundador da Magnetis, é ter rotinas recorrentes de reports. Enviar um report mensal padronizado com os principais KPIs e pontos qualitativos, ajuda o investidor a estar a par do andamento do negócio, evita surpresas desagradáveis e potencializa o valor agregado do investidor. Esse tipo de “prestação de contas” é escalável (com um e-mail enviado mensalmente para todos os investidores em cópia oculta, por exemplo) e garante que interações individuais ou em reuniões de conselho sejam mais produtivas.

E o conselho?

Muitos investidores vão pedir assento no conselho, porém não é algo que deva ser distribuído apenas porque foi solicitado. No início, é discutível se o negócio precisa de fato formalizar um conselho. A operação deve ser ágil e um conselho implica em tempo (do time e dos founders) destinado ao preparo de materiais, embasamento de discussões, etc. Muitos empreendedores acreditam que não faz sentido ter um conselho formal antes do Series A. De qualquer forma, o board deve ser montado pelos time de fundadores e esses devem deter o controle. Seguem algumas dicas que aprendemos sobre governança:

Montar um conselho:

  • No início, quanto menor o conselho, melhor.
  • Normalmente, o convite para o conselho não tem prazo de validade definido, ou seja, à medida que entram mais investidores, o conselho tende a crescer.
  • Escolha o sócio do fundo investidor com quem você, como founder,tem uma boa relação. Ou então, opte por quem você acredita que pode agregar mais.
  • Tenha em mente que assento em conselho é uma moeda valiosa que não pode ser entregue para qualquer um a qualquer momento. Se você tem um investidor que entra no Series B, mas cujo ponto forte é a partir do Series C, ele vai querer assento no B. Você terá de fazer com que ele gere valor até o C, para que ele mereça o assento após a rodada de Series C.

Dimensionamento do conselho:

  • [Series A] 3 assentos: 2 founding team + 1 investidor
  • [Series B] 5 assentos: 3 founding team + 2 investidores | 2 founding team + 2 investidores + vacante
  • [Series D] 7 assentos: 4 founding team + 3 investidores | 2 founding team + 3 investidores + 2 vacantes

Aumentar o aproveitamento da reunião:

  • Periodicidade: o padrão é ter 1 reunião de conselho por trimestre.
  • Agendas: é fácil gastar mais tempo do que o necessário alinhando disponibilidades. Deixar as reuniões pré-marcadas e bloquear agendas com antecedência sempre ajuda.
  • Pré-alinhamento: para garantir que todos estejam na mesma página e antecipar anseios, assuntos e sugestões de cada conselheiro, vale investir em um call individual com cada um. Mandar um material ANTES da reunião, para que os conselheiros possam se preparar, também é importante.
  • Formato: considerando que possivelmente seus conselheiros têm outras 10 reuniões de conselho, vale dar aquela força para facilitar o acompanhamento de todos. Padronizar o formato e a dinâmica da reunião ajuda.
  • Pauta: é muito fácil se perder em minúcias que não agregam valor para a empresa. Garantir uma pauta estratégica e se esforçar para seguí-la é papel do CEO.

Aqui vai uma lista de dicas do Sequoia sobre materiais e reuniões de conselho.

Tudo é uma negociação

De termos da rodada até salário dos founders: tudo vira negociação, quando se fala de decisões entre empreendedores e investidores.

Investidores atuais x novatos:

Investidores atuais podem (e devem) ter um papel importante em rodadas subsequentes, seja pelas conexões, pela reputação ou pela intenção de inserir mais capital. Os termos de cada rodada, porém, são definidos pelo líder e é normal que novos investidores imponham outros termos. O papel do founder é entender o que é importante para a empresa e gerir as expectativas de cada investidor. Atente-se para o fato d e que investidores atuais minoritários não devem influenciar em novas rodadas, mas lembre-se, ao mesmo tempo, que não é bom “atropelar” quem apostou em você no início.

Secundárias:

Pedido de founder de venda de ações de forma secundária, no early stage, não é bem recebido por seus investidores normalmente. O empreendedor deveria tratar a ação da sua empresa como o bem mais valioso do mundo e ser completamente exigente com quem tem acesso a ele. Vender sua participação cedo demais, portanto, implica em desalinhamento de valores e pode deixar os investidores com o pé atrás. Já em estágios mais maduros, vale a negociação.

Aumento salarial do founder:

Pedir mais salário é desaconselhado no early stage. Na visão dos investidores, todo recurso possível deveria ser destinado à construção da empresa. Tirar um salário muito maior do que o necessário para viver de forma confortável pode parecer um sinal de desalinhamento de longo prazo do empreendedor, na visão do investidor. Por outro lado, para todos os envolvidos, é importante garantir que o empreendedor esteja com foco total no negócio — portanto lembre-se de negociar um salário que não faça você passar aperto financeiro na vida pessoal. Bom senso é bem importante nesse ponto.

Comunidade

Quando um fundo de venture capital investe na sua startup, você entra em uma seleta comunidade de gente que está no mesmo barco ou em barcos que já passaram pelos desafios que você está passando. As startups investidas pelo fundo são uma fonte de expertise que pode poupar muito tempo e esforço (e vale explorar oportunidades comerciais também). Para alavancar esse tipo de conexão, faz sentido estar próximo das pessoas mais juniores na hierarquia do fundo, ou das pessoas dedicadas às investidas. De novo: é importante reforçar a necessidade de transparência e de comunicação recorrente para potencializar o valor que o investidor é capaz de agregar.

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Written by Canary

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