A bolha que cresce, mas não explode

Canary
6 min readApr 14, 2021

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por Izabel Gallera, partner do Canary

Não é raro que a palavra “bolha” seja usada no universo de venture capital (VC). Um significado comum diz respeito a contextos de alta liquidez — como o que vemos atualmente — e o receio das possíveis consequências desse cenário. Outro é o da “panelinha”, um grupo fechado de pessoas que orbitam esse mundo. Entre as duas, há uma sutil diferença: só a segunda traz efeitos benéficos para todos os envolvidos quando cresce.

Não é à toa que o termo “bolha” aparece nesse segundo conceito: venture capital sempre foi — e ainda é — um recorte muito específico da indústria de investimentos. Para seguir no VC track, não basta só ser um bom negócio. É preciso atender a altas expectativas: toda empresa investida por um fundo de VC deveria ter o potencial de multiplicar seu valor a ponto de retornar o total desse mesmo fundo. Se um fundo captou US$ 100 milhões e investe US$ 1 milhão em uma startup, espera-se que, a grosso modo, o valor desse cheque se multiplique 100 vezes dentro do período total do fundo (normalmente, um prazo de 8 a 10 anos). Em bom português: espera-se que empresas investidas de VC cresçam muito e muito rápido.

Nem todo modelo de negócio permite essa velocidade de crescimento. Nem todo segmento de indústria tem espaço para tanto. E nem todos os fundadores e fundadoras têm sonhos compatíveis com esse modelo. E tudo bem, é apenas um jeito de jogar o jogo (sem juízo de valor aqui). Mas é um jogo que já exclui muitos logo de cara — e por isso, talvez a bolha de pessoas ao redor desse mundo nunca exploda. Mas isso não significa que ela não possa crescer (e muito), especialmente se o acesso de perfis e backgrounds diferentes for ampliado.

Historicamente — leia-se: nos primeiros ciclos de startups apoiadas por VCs que tiveram crescimento significativo no Brasil — , times que levantaram capital de risco tinham enormes semelhanças. Grande parte era composto por homens, brancos e com formação acadêmica em escolas de ponta nos EUA, como Stanford ou Harvard. A maioria dos investidores, por sua vez, também tinha o mesmo perfil. Não há nenhum demérito nisso. Pelo contrário: fluência no inglês e selo acadêmico eram (e ainda são, em muitos casos) as alavancas necessárias para acessar capital global e garantir a sobrevivência e o crescimento de uma empresa.

Mas uma empresa não se faz só com fundadores e investidores: elas precisam de gente boa construindo e operando junto. Com a chegada de talentos, que em muitos casos estão fora dessa panela, as startups conseguem estabelecer o tripé que as faz gerar valor para a sociedade, desembocando em liquidez e no desenvolvimento de uma indústria. Essa é uma das formas que a panela cresce — e no Canary, levamos esse processo a sério.

Quando meus sócios começaram o Canary, em 2016, eles convidaram 50 fundadores e operadores de empresas de tecnologia para investir no primeiro fundo. A ideia era iniciar a formação de uma rede e escalar nosso acesso a founders, talentos e oportunidades de negócios. Quando me juntei ao time, em 2018, um dos meus objetivos era “gerir essa rede” — algo que ninguém sabia muito bem o que significava e nem como fazer. Já era claro, porém, que o trabalho era importante.

De lá para cá, o conceito de rede evoluiu: hoje, abraça todas as pessoas que fortalecem o fluxo de valor entre os stakeholders do Canary — investidas, investidores, talentos, empreendedores buscando capital, potenciais clientes e fornecedores de serviços de startups, etc. Somos um negócio que coloca as pessoas no core: investimos em fundadores e fundadoras que vão contratar talentos para construir negócios que podem gerar valor para muita gente. Nada mais natural do que olharmos para a rede como o nosso maior ativo — um mantra que está no nosso deck de fundraising e na apresentação de boas vindas para as empresas nas quais decidimos investir.

Mas o que isso tem a ver com a bolha do início do texto? Tudo. As pessoas com quem nos relacionamos e a forma como fazemos isso vão ditar nosso negócio no curto, médio e longo prazo. É por meio desse relacionamento que aumentamos nosso acesso a pessoas, que acabam participando do Canary de diferentes formas. Podemos investir nelas, ajudá-las a se unir a um time, solicitar apoio para outras empresas, receber investimentos delas nos nossos fundos… e a lista vai embora. Para esclarecer a importância dessa rede, vale citar alguns números:

  • Desde o início da operação do Canary, 73% dos leads no nosso pipeline de investimentos chegaram até nós por meio de pessoas com as quais mantemos relacionamento.
  • Entre os talentos que ajudamos a serem contratados por investidas, 90% deles nos são apresentados via rede;
  • Em 2020 apenas, realizamos 1022 conexões entre as pessoas da nossa rede. Delas saíram: parcerias comerciais, contratações de talentos, rodadas de investimento, investimento anjo, ajudas técnicas e estratégicas e outros tantos valores a serem capturados em algum momento;

Para mim, o que torna singular a forma como nos relacionamos com essa rede é a visão de longo prazo. Não fazemos conexões pensando apenas em uma única transação ou objetivo: queremos agregar valor para quem está perto da gente. Acreditamos que o que fica são as pessoas, não necessariamente os negócios — e que quando a gente se preocupa com isso, a chance de termos resultados positivos (a qualquer momento) é muito alta.

Você pode ter lido esses números e essa conversa e ainda assim estar pensando “ok, mas o conceito de panela permanece”. Minha resposta para isso é que “sim, ainda existe”. O que decidimos fazer é ativamente expandir essa panela. Muito do que tenho feito nos últimos tempos está ligado a isso: acesso a novos mercados, novas pessoas, buscando conhecer gente complementar ao perfil atual da panela (que vai mudando ao longo do tempo), com o objetivo de acessar e construir novas oportunidades com pools de fundadores, fundadoras e talentos que não estariam conectados com o nosso mundo há cinco anos.

O mandato do Canary é investir em pessoas capazes de construir soluções escaláveis para resolver problemas gigantescos no Brasil — e esses problemas não são exclusivos da panela, muito pelo contrário.

Na minha visão, a nossa rede é a semente dos nossos investimentos futuros. Ou seja, se queremos aumentar a representatividade dos times que investimos, precisamos construir uma rede diversa. Sei que não é uma tarefa fácil nem rápida. Construção de relacionamento por si só tem seus empecilhos. Adicione ainda o contexto de VC/tech/startups e o fator “expansão”, que já denota que estamos buscando sair da “zona de conforto”.. É algo contínuo e que pode demorar para enxergarmos ROI. Mas acredito (e aqui, falo por todos no Canary) que estamos bem posicionados para contribuir de forma relevante para que mais soluções escaláveis nasçam para resolver problemas grandes do Brasil. Quanto mais gente estiver dentro dessa bolha, melhor.

And just in case, if you wanna join the network…

  • Quer trabalhar em uma investida do Canary? Mande seu perfil do LinkedIn para talent@canary.com.br com o assunto “[Vagas Investidas] — Seu Nome”
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Artigo originalmente publicado no LinkedIn, em 7 de abril de 2021.

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Parceiro dos melhores founders na América Latina. Por aqui, compartilhamos os principais aprendizados de empreendedores(as) investidos(as) e de nossa rede.

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