Pequeno guia de growth B2C com Alexandre Alvares, da Neon

Canary
10 min readDec 15, 2020

Há alguns anos, a Neon lançou um desafio: convidou clientes a pouparem seu dinheiro por 52 semanas. Para ajudar nessa missão, criou um kit completo com tabela, planilha e guia de investimentos, além de incentivar a interação entre as pessoas engajadas na iniciativa, por meio de um grupo — espécie de rede de apoio — no Facebook.

O projeto não só traz mais visibilidade para a marca, como ajuda na construção de um dos pilares fundamentais para o crescimento orgânico de uma empresa B2C: cria senso de comunidade. Consumidores que se sentem parte de um movimento — e acabam por criar vínculos com outras pessoas na mesma situação — tendem a se conectar mais com a marca.

Para Alexandre Alvares, head da Pessoa Física da Neon, comunidade, conteúdo e produto são uma tríade essencial para quem quer growth e quer gastar pouco. Se trabalhados de forma estratégica desde o começo, os três são ótimas bases para uma escalada saudável e mais independente de canais pagos.

O primeiro passo para começar a pensar nessa fundação, não tem jeito, é conhecer bem o seu cliente, suas reais necessidades e interesses. Isso deve pautar não só as melhorias no produto, como o desenvolvimento de conteúdo e a ideação de ações de engajamento. Alexandre compartilhou a lição em um Canary Talks com foco em growth B2C, mediado por Matheus Moraes, co-founder da Alice. A conversa, realizada em outubro deste ano, rendeu algumas boas dicas para startups no early stage que querem crescer e, ao mesmo tempo, fugir do óbvio.

Time

Montar o time, sem dúvidas, é um dos primeiros grandes desafios de um(a) founder no começo de sua jornada. É preciso trazer pessoas mão na massa e, em geral, a recomendação é por um perfil mais generalista.

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Alexandre segue nessa mesma linha. Para chegar ao seu consumidor final no começo, é melhor optar por alguém que tenha experiência em mais de um canal. “Alguém muito forte só em mídia pode perder a chance de explorar conteúdo, SEO etc. É importante contar com um(a) profissional mais sênior, e que tenha tempo de vivências diversas”, acredita. Conforme o time for crescendo, o caminho natural é ele se tornar cada vez mais especializado.

Equipe de growth, ter ou não ter? — ‘Como eu posso crescer hoje?’: parece slogan, autoajuda talvez, mas growth é quase um lifestyle. Mais do que um time focado em crescimento, vale cultivar esse feeling em todos.

“Não tenho mais acreditado no conceito de ter um time de growth. A prioridade deve ser por construir a mentalidade e inserir os processos de growth, criar uma dinâmica que permita que todas as equipes se organizem para estarem sempre testando, com o objetivo de entender quais são as etapas onde estão os maiores desafios e como superá-los”.

Teste, teste, teste

Por falar em testes, no early stage, aproveite para experimentar! “Tente fazer coisas que não necessariamente escalem. Existe muito espaço para se aproximar do usuário”, defende Alexandre. Pode até parecer contraintuitivo investir tempo (e dinheiro) em algo que não garanta um retorno rápido, mas os ganhos podem ser altos lá na frente.

Como já apontamos por aqui, em um texto bem completo sobre branding nos primórdios das startups, apostar apenas em canais pagos como Google Ads pode não ser a melhor estratégia a longo prazo. O pulo do gato é ir atrás de clientes mais recorrentes, que realmente se identifiquem com o negócio, para não ter de ficar gastando cada vez mais com anúncios. Afinal, o cenário pode mudar rápido e os ads podem vir a converter muito menos ao primeiro concorrente que aparecer na esquina.

Há muitos formatos alternativos de relacionamento com o cliente, que podem ser eficientes tanto para conhecer quem de fato precisa e gosta do produto quanto para fidelizar esse perfil. Conteúdo bom e relevante é um deles — e quanto antes der para começar, melhor.

Pode ser interessante recorrer ainda a kits, benefícios exclusivos, conversas com altos executivos da empresa etc… A dica do Alexandre é ser criativo e aproveitar esse começo para arriscar. Podem surgir daí alguns insights fundamentais sobre como a empresa pode escalar no futuro. Abaixo, um exemplo prático da Neon:

“Quando a gente lançou nossa ferramenta de investimentos, optamos por uma ação cirúrgica. Levantamos quem eram os clientes mais engajados e quais pessoas estavam comentando sobre a feature nas redes sociais. Depois, gravamos um vídeo personalizado para cada um e enviamos o link com um brinde para a casa dessas pessoas. Os comentários desses clientes e a proximidade que a gente ganhou com eles foram muito importantes para a gente entender como gerar expectativa e construir diálogo. Isso ajudou muito na hora de lançarmos o cartão de crédito. Aí sim fizemos um lançamento mais amplo e o teaser chegou aos trending topics do YouTube sem que gastássemos um centavo para impulsionar”.

Google, Facebook, Instagram etc — por enquanto, em 2020, pelo menos uma dessas plataformas deve ser essencial para brand awareness e para conquistar clientes. Não dá para deixar de lado e é preciso fazer bem feito: saber medir, ter um tracking bom, discutir modelo de atribuição e testar.

“Você sabe que acertou o canal quando começa a escalar e mantém a eficiência por um bom tempo, até entrar em um platô”, explica Alexandre. Mas, de novo, não dá para relaxar. “Nunca fique em um canal só para não construir uma dependência. A dinâmica do mercado muda constantemente e é importantíssimo ter um ou dois testes de canais todo mês”.

Looping de indicações

Você provavelmente deve lembrar de quando o Uber chegou no Brasil e choviam mensagens dos seus amigos com seus códigos de indicação e um pedido maroto: “se ainda não tiver usado o Uber, usa o meu código para a gente ganhar desconto?”. Pois bem, ter (boas) pessoas indicando o produto é sempre um trunfo importante para quem está começando e precisa ganhar relevância de marca — e clientes. Uma frente que pode ser explorada é construir um mecanismo interessante de referral, nesse estilo member get member. Algumas boas práticas são importantes aqui:

  1. Entenda a legislação do seu mercado. Em alguns casos, incentivos financeiros não são permitidos e aquele papo com o jurídico antes de lançar a ação é essencial.
  2. Idealize benefícios de modo que haja valor para as duas pontas: tanto para o usuário que indica o serviço, quanto para o novo que chegou por esse canal. Aqui, vale testar também. Às vezes é mais poderoso investir em uma experiência exclusiva, que é difícil de precificar, do que em um desconto, por exemplo. “Eu começaria a pensar sempre pelo lado de quem vai indicar”, diz Alexandre. “Se a pessoa está satisfeita, vai se esforçar mais”.
  3. Pense muito bem em qual ação você quer estimular. No caso do Uber, por exemplo, não basta criar uma conta, mas é preciso realizar a primeira viagem para ganhar o desconto. Isso é fundamental para garantir que o novo usuário esteja efetivamente usando o serviço, o que é o objetivo real da plataforma.

Influenciadores — parcerias com influenciadores também podem ser uma boa opção para conseguir mais referências — ainda que nesse caso a indicação venha mais claramente de um acordo comercial. “É uma oportunidade de ter um alcance bom e riscos baixos”, diz Alexandre.

E aí vem a pergunta: é melhor fechar com um só influenciador grande ou vários pequenos? Depende do objetivo e do budget. Em geral, gastar muito com um influenciador com milhares de seguidores é ótimo para brand awareness, mas não tão eficiente em termos de conversão. Se a meta for aumentar as vendas, tratar com influenciadores de pequeno e médio porte, mas mais focados no seu assunto de atuação, pode render mais retorno e fazer essa conta fechar melhor.

Alerta fundamental: cuidado na curadoria. Influenciadores são seres humanos e, como tais, têm opiniões, erros e acertos. Busque pessoas que tenham muita afinidade com a marca e que não devam se envolver em posicionamentos contrários ao que você acredita para não dar um tiro no pé.

Branding x short-term acquisition

Aqui cabe uma diferenciação básica: branding não é a mesma coisa que brand awareness. Ou seja, investir em branding não significa necessariamente colocar uma grana em campanhas para que as pessoas conheçam mais a sua marca.

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Você, leitor fiel do nosso Medium, já deve estar careca de saber que branding tem muito mais a ver com garantir consistência de marca e perpassa toda a experiência do cliente. “É ter uma proposta de produto e valor que se diferencie e seja clara para o seu consumidor”, como bem reforçou o Alexandre. Por isso, nunca é cedo demais para pensar em branding. Desde o começo, é preciso carinho e cuidado com toda a comunicação e também com o seu público.

Uma startup começa a construir marca de baixo para cima no funil. A grande dificuldade é saber qual é o momento ideal para efetivamente apostar no topo e criar aquele buzz para o seu negócio. Além de ser mais difícil de medir o retorno desse esforço, há aí um risco maior, já que o nome da empresa estará na boca do povo, e chegará a pessoas que nunca tiveram nenhum relacionamento prévio com ela.

Para Alexandre, é melhor só dar esse passo quando a startup consegue garantir cadência e um orçamento separado para fazer esse teste. E tem de ter alcance. “A gente fez uma campanha gigantesca e a mudança de brand awareness foi tremenda. No entanto, se olhar para o curto prazo, o CAC subiu muito”, conta.

Vendas 100% digital ou inside sales

Quanto você está disposto a ter de CAC? Essa é a primeira pergunta a ser feita para decidir se compensa inside sales. Aqui, há uma série de custos, com contratação e treinamento da equipe comercial, que não são parte da realidade de um e-commerce.

A recomendação é ter total clareza da rentabilidade do que está à venda, para decidir se vale a pena tentar dar esse boost nas vendas ou não. Se quiser experimentar com apenas um dos seus produtos, a dica é entender qual tem taxa de conversão maior e começar por esse.

Aquele papo rápido sobre métricas

Para quem está no early stage e tem apenas meses de vida, olhar para Lifetime Value pode ser complicado. “É futurologia, dá para ter estimativas, mas não certezas”, explica Alexandre.

Na Neon, o foco tem estado em CCR (Custo do Cliente Retido), indicador que une o CAC à retenção do cliente. Para calcular, é preciso comparar diferentes “safras” de consumidores ao longo de um determinado período e monitorar quantos estão chegando e quantos se mantêm.

“Ao considerar só o CAC, você consegue traçar estratégias para encontrar uma porção de usuários, mas não necessariamente eles são o seu cliente ideal. Ao combinar com a retenção, você consegue perceber se está no caminho certo para construir relacionamentos mais duradouros com o seu público. Ter um bom CCR indica que não só estou adquirindo com intensidade, mas com qualidade também”.

Uma dúvida que paira no ar é quando ter certeza de que o tal do product-market fit foi conquistado no B2C. Há muitas pistas que ajudam nessa resposta. Normalmente a startup chegou lá quando verifica que está difícil de gerenciar o nível de crescimento. Claro que, nesse caso, essa ascensão tem de ser, em grande parte, orgânica.

De qualquer forma, medição e atribuição de funil de vendas é algo para a vida toda da empresa. Compreender o comportamento do usuário também. Um pouco mais sobre isso aqui embaixo.

Churn — Terror dos empreendedores, churn rate é uma métrica que sempre deve estar no radar mesmo. Para evitar uma alta na taxa, o primeiro passo é entender de fato quem é o seu cliente e do que ele precisa. Voltamos aqui a uma palavra mágica: teste. Alguns do’s fundamentais:

  • Pesquisa com o cliente — Tenha os ouvidos muito atentos nos mais diversos canais para entender o que falta em produto para segurar e fidelizar o seu público-alvo. E seja proativo para promover sempre essa conversa com os consumidores, pergunte, acompanhe o NPS.
  • Análise de dados para compreender o ponto de inflexão de churn — É preciso saber com propriedade a partir de qual momento o valor do produto fica mais evidente para o cliente e a taxa de churn cai drasticamente. (Fun fact: até mesmo a Netflix divulgou uma pesquisa há alguns anos que indicava a partir de qual episódio os espectadores tendiam a ficar viciados em determinadas séries).
  • Testes para saber qual tipo de venda é capaz de evitar o churn para cada tipo de cliente — Diversifique os canais e veja qual é o mais eficiente para diferentes perfis.

Três erros comuns de founders em busca de growth

Ansiosos por um crescimento rápido, frequentemente fundadores de startups cometem erros básicos, que podem ter impactos depois. No Canary Talks, foram levantados alguns dos principais equívocos nessa fase:

  1. Olhar muito a curto prazo e esquecer de pensar à frente

Cenário: suponha que você é um serviço de delivery e quer aumentar o número de cadastros de usuários. Para isso, lança uma super promoção e oferece a primeira entrega quase de graça. Boom! A quantidade de novos inscritos explode. Mas voltamos ao ponto da qualidade x quantidade aqui: uma barreira de entrada menor, em geral, resulta em um nível de comprometimento mais baixo. Muito provavelmente, esse cliente fará menos transações no futuro e não é o perfil certo que você gostaria de alcançar.

Vale lembrar que um negócio sempre tem de estar alguns steps adiante, traçar metas e objetivos para o longo prazo, garantir runway para os meses seguintes e definir estratégias para conquistar mais clientes e também investidores. Aliás, quando se fala em fundraising, cultivar relacionamento com potenciais interessados deve ser parte da rotina de um(a) founder — deixar para procurar investimento quando o dinheiro está acabando é arriscado.

2. Demorar para investir no que demora para escalar

Falamos sobre isso mais para o começo deste texto (obrigado por estar lendo até aqui), mas, no early stage, pode ser muito poderoso investir em coisas que não necessariamente escalam rápido. Um exemplo? Conteúdo. É valioso demais ter informações e materiais exclusivos, que conversem diretamente com o público que você quer alcançar. E é uma ótima forma de se aproximar do usuário, agregar valor e, claro, ser encontrado de forma orgânica no Google.

Depois, quando a empresa pega certa velocidade e precisa focar mais no operacional do dia a dia, testar canais diferentes acaba virando prioridade zero. Uma hora, vai fazer falta…

3. Achar que é sempre melhor terceirizar branding e marketing de performance

Terceirizar o marketing de performance ou branding de uma empresa que está começando pode ter custos altos e dificilmente alguma agência terá tanta propriedade e conhecimento de causa quanto o founding team. Cabe à equipe interna definir a marca e tom de voz — até para garantir a consistência.

Contudo, em alguns casos, terceirizar pode ser, sim, uma opção. Por exemplo, quando a empresa tem poucos meses de runway e precisará olhar em breve para os custos fixos e variáveis. Nessa situação, é mais fácil cortar uma agência do que demitir funcionários.

Enfim, se achar melhor terceirizar, é importante garantir que esta é uma decisão inteligente em termos de gastos e manter a rédea curta. Tenha alguém interno responsável por acompanhar esse trabalho e dar bons insights à produção que vem de fora.

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